O vice-presidente da República, Hamilton Mourão acredita que a venda das refinarias da Petrobras, anunciada na semana passada, é positiva para o país e que a entrada de novos agentes no mercado, hoje monopolizado pela estatal, pode ajudar, inclusive, a atrair capital para expansão da capacidade de refino.

Alinhado com a visão econômica de Paulo Guedes, Mourão afirmou ser contra políticas de reserva de mercado, por meio de exigências de conteúdo local para indústria naval, e não vê impedimento na entrada de capital estrangeiro no setor nuclear e no desenvolvimento do pré-sal.

O vice-presidente também acredita que a privatização da Eletrobras deve ficar para outro momento no futuro e ser alvo de estudos mais aprofundados, até porque há projetos na fila, como a venda da BR Distribuidora e das refinarias da Petrobras, que seriam operações mais viáveis no contexto atual.

Mourão conversou, nessa segunda-feira, 29, com o Político, serviço exclusivo da epbr de cobertura dos bastidores do governo e do Congresso. Veja trechos da entrevista:

Petrobras

Como o sr. recebeu o plano da Petrobras de vender 8 refinarias, quase metade da sua capacidade de refino?

Eu vejo positivamente. Desde a campanha eleitoral, o presidente já tinha sinalizado que via que as áreas de refino e distribuição estavam prontas para serem privatizadas. Nós temos um déficit de refinarias aqui no Brasil. Talvez ao iniciar, ao vender esses ativos da Petrobras, ela [a Petrobras] vai se capitalizar para outras atividades mais importantes que tem, como a própria exploração do petróleo na área do pré-sal. E poderá atrair mais gente para montar refinaria aqui no Brasil.

Nós temos 12 refinarias, se não me engano. Então a gente produz petróleo, exporta petróleo bruto e importa os derivados porque não temos capacidade para refinar a totalidade da nossa produção. É um flanco exposto tremendo. A gente acaba pagando mais caro.

O movimento do presidente Bolsonaro, quando determinou o adiamento do reajuste do diesel, não pode prejudicar essa venda das refinarias?

Acho que não. O presidente já entendeu a mecânica do reajuste do preço do combustível. Até aquele momento ele não tinha se dado conta que o preço do combustível está ligado aos preços internacionais. Muitas vezes a pessoa pode pensar “eu extraio o barril aqui em real e cobro em dólar?” Não é isso que ocorre.

Política industrial e indústria naval

O sr. concorda com a visão que a Indústria Naval deve ser um setor estratégico e que é preciso conteúdo local para garantir encomendas aos estaleiros?

Política de conteúdo local tem que ser econômica. Não é possível ser como aconteceu durante a época do governo da Dilma (Rousseff, ex-presidente da República). Levou a preços estratosféricos. Na questão da contratação das plataformas de petróleo, a plataforma contratada aqui no Brasil custava quatro, cinco vezes mais que aquela que você contratava fora do país.

A questão do conteúdo local tem que ser bem avaliada. E dentro daquilo que o Paulo Guedes (ministro da Economia) pensa de abertura comercial, eu acho que se nós abrirmos efetivamente o nosso mercado vai operar quem tem capacidade.

Acho que podemos ter um determinado nicho, por exemplo: não vamos ser os construtores de navios transoceânicos, vamos colocar assim, mas podemos ter um nicho de mercado para navegação de cabotagem, que está morta e está na hora de ressuscitar.

O sr. defende alguma política?

Não defendo reserva [de mercado]. Esse tipo de intervenção do Estado, numa situação como a do Brasil, termina com mais malefícios do que benefícios.

Investimento estrangeiro

Como o sr. vê a entrada de estrangeiros no setor de geração de energia nuclear?

Tem a segurança orgânica, natural ao lidar com um tipo de combustível que, em caso de vazamento, de acidente, tem consequências graves para a população no entorno. Agora, em termo de projeto, o nosso projeto não é tão secreto assim que outras nações desconhecem. Não temos nada ali tão novo, que seja uma solução brasileira em termos da produção da energia. Então não vejo [problema]. Começamos com um acordo com Alemanha [para a construção de Angra 1, iniciada em 1972], e tem que terminar Angra 3. A energia nuclear, no final de contas, é uma energia limpa. Temos uma quantidade boa de urânio aqui no país e não podemos fechar as portas para a energia nuclear.

A empresa russa Rosatom já demonstrou interesse em investir no Brasil. O governo está aberto para estrangeiros operando usinas nucleares?

Não há questão de fundo político-ideológico. Há a questão objetiva de a gente ter um parceiro confiável e ele também confiar nas regras que vamos estabelecer aqui para ter o contrato e atingir o objetivo principal que é terminar a usina [Angra 3] e colocá-la em pleno funcionamento.

E novas usinas nucleares?

Defendo. Em um segundo momento, quando tiver mais liberdade de manobra de recursos, poderemos ter usinas em outros lugares do país que são necessárias. Temos lugares do Brasil que são abastecidos por termelétricas a óleo. Tem que ter um planejamento estratégico para isso.

O sr. acredita que o Linhão de Tucuruí é o melhor caminho para integrar Roraima?

Acho. Temos energia no restante do país, por enquanto, já que a economia não está ainda em um nível de crescimento maior, então temos energia para Roraima e para acabar com a escravidão da energia da Venezuela, com os problemas que o país enfrenta, e também a questão das termelétricas. O consumo de óleo é até difícil de transportar e colocar lá [em Roraima] em uma situação de emergência.

A China pode ser um parceiro importante para os leilões do pré-sal previstos para 2019?

Acho que dentro dessas cessões (leilões do excedentes da cessão onerosa e 6º leilão do pré-sal) que vão ocorrer do pré-sal, as empresas chinesas que quiserem entrar, vão entrar. Não vejo mistério nenhum nisso. [A China] tem uma busca constante em solucionar o problema de energia, porque ela precisa, então não vejo problema nisso. Até porque a China é uma parceira estratégica do Brasil.

Privatizações

O governo ainda discute qual a melhor forma de privatizar a Eletrobras, se vendendo o controle da holding ou vendendo suas estatais. O que senhor acha?

A Eletrobras é objeto de altas discussões. Até agora não me debrucei em um estudo mais aprofundado sobre o caso. Isso vai ser discutido em algum momento, dentro desse projeto das privatizações que vão ocorrer, mas vejo que a Eletrobras talvez seja jogada mais para frente. Primeiro vai se trabalhar naquelas privatizações que são mais simples de serem executadas e dar um tempo para uma discussão mais aprofundada do caso da Eletrobras.

E venda da BR Distribuidora, das refinarias…

São mais simples, vamos colocar assim. Daria um Norte maior para depois se debruçar com vontade no problema Eletrobras.

E como fica a questão da visão, existente até em alguns círculos militares, da Eletrobras como uma empresa estratégica?

Qual o grande problema das empresas estatais? Elas começam como uma excelente ideia. “O estado tem que intervir, tem que fazer”, mas depois ela vira um mastodonte. Aí há o uso político. O nosso governo não está fazendo uso político, como os governos anteriores fizeram, essas manobras espúrias. A partir do momento que tira isso [as estatais] do jogo político e deixa ao sabor efetivo das forças do mercado, acho que é melhor para a população. Tem aquela máxima do Keynes: “o governo só deve fazer aquilo que os outros não podem fazer”. Aquilo que ninguém pode fazer? Tudo bem, o governo vai lá e faz. Num primeiro momento foi preciso fazer, agora essa turma já anda com as próprias pernas.

Fonte: epbr