Existe uma preocupação sobre o que acontecerá com o RenovaBio quando o próximo presidente assumir. No entanto, o programa não está parado e o próximo governo herdará as decisões que estão sendo tomadas agora.
Nos próximos dias, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) deve tomar uma decisão sobre uma etapa crucial do RenovaBio: a definição de quais regras ambientais as usinas precisarão seguir para emitir os famosos créditos de descarbonização (CBios). Essa decisão afetará tanto a regulamentação do programa quanto o RenovaCalc, a ferramenta que dará nota para as usinas.
A ANP pode, de forma resumida, seguir dois caminhos. Um que diminui as exigências ambientais estabelecidas até então no RenovaBio, facilitando a adesão das usinas; e outro que mantém as regras ambientais, tornando o processo de certificação mais correto ambientalmente – o que também implica em mais dificuldades para as usinas se certificarem.
Em um primeiro olhar, parece que é muito melhor para o setor de biocombustíveis que a ANP decida por uma regulamentação que facilite a certificação das usinas. Afinal, são elas que tem que aderir voluntariamente ao programa para que haja CBios. E, quanto mais CBios, mais garantido é o sucesso do programa, e mais dinheiro chegará às mãos do setor, certo? Errado.
O RenovaBio está sendo construído para ser um grande programa de descarbonização e não um programa de ajuda às usinas de biocombustíveis.
É com esse conceito que a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) e a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) estão trabalhando para apresentar os CBios ao mercado financeiro. O que essas instituições querem é que os CBios sejam comprados não só pelas distribuidoras, mas pelo maior número possível de pessoas, físicas e jurídicas.
Mas por que outras empresas, fundos, entidades e até mesmo indivíduos estariam interessados em comprar CBios se eles não são obrigados pela lei, como ocorre com as distribuidoras? A resposta para essa pergunta é a razão de ser do Renovabio: o mundo precisa reduzir – e muito – suas emissões de carbono.
As empresas estão sendo pressionadas mais a cada dia para ter emissão zero de carbono. Como muitos não conseguem diminuir a sua pegada de carbono, resta comprar créditos de quem está reduzindo as emissões. É aí que entra o RenovaBio e o processo de certificação das usinas.
No mundo fora do setor sucroenergético, não há muita preocupação com o trabalho que uma usina vai ter para entrar no RenovaBio. O que os potencias compradores querem – e eles vão se assegurar disso – é que os CBios e o RenovaBio sejam realmente o que dizem ser.
Eles vão olhar para o desmatamento, para as áreas de plantio e para todas as regras da RenovaCalc com uma lupa. Toda essa análise será realizada por vários grupos e consultorias mundo a fora com o objetivo de que os interessados em comprar CBios tenham toda a garantia de que cada quilo de carbono constante no certificado realmente deixou de ir para a atmosfera. Em resumo: o programa precisa de credibilidade.
E, se nesse escrutínio, os interessados descobrirem que as regras do RenovaBio permitem o desmatamento, que há erros de cálculo na calculadora, ou que as premissas estão equivocadas? Então, o mercado de CBios ficará realmente restrito às distribuidoras.
Um RenovaBio limitado às distribuidoras é, acima de tudo, um RenovaBio pequeno, é um RenovaBio pobre e sem ambições. O dinheiro que fluirá para as usinas será apenas aquele que sairá das distribuidoras e, por enquanto, limitado ao valor da multa aplicado a elas.
Já um RenovaBio que não permita novos desmatamentos, que seja preciso no cálculo da redução de carbono e que se permita aperfeiçoar cada vez mais o processo de certificação, vai abrir o mercado de CBios para todo o mundo. Todas as empresas, países ou pessoas que quiserem reduzir a sua pegada de carbono poderão comprar os papéis com a garantia de que estarão realmente fazendo bem para o planeta.
Nessa segunda opção, os recursos para as usinas devem fluir não apenas do restrito mercado das distribuidoras – limitado pela multa e pelas próprias metas –, mas dos bilhões e bilhões de dólares existentes no mercado financeiro e de capitais. Esse seria um RenovaBio grande, rico, ambicioso.
Por esse motivo, a ANP deve se preocupar mais em criar as bases de um programa sólido e não tanto com o número de usinas que irão aderir no começo do programa. É o dinheiro do CBio que atrairá as usinas.
Aliás, pela forma como o RenovaBio está estruturado atualmente, quanto menor o número de CBios gerados, maior poderá ser o valor de cada um dos títulos. Isso já seria, por si só, um incentivador para que as usinas busquem a adesão ao programa o quanto antes. Mas muitas unidades só irão investir no RenovaBio depois que verem o nível de preços que os CBios estão sendo negociados – o que novamente reforça a importância de garantir o interesse do resto do mundo nesses papéis.
Está nas mãos da ANP decidir se o RenovaBio será grande ou pequeno. Esse passo também decidirá se a agência se engrandece ou se apequena.
Fonte: NovaCana.com